Najar Tubino
Jazer significa estar morto ou
como morto. Esse é o caso do dito cujo. Os Objetivos de Desenvolvimento do
Milênio, assinado por 189 países em 2000, definiu oito pontos principais, entre
eles, combate a extrema pobreza, mortalidade infantil, igualdade de gênero,
redução das doenças transmissíveis como AIDS, malária e tuberculose, ensino
fundamental e um melhor gerenciamento do desenvolvimento. O prazo acabou em
2015, ano em que o 1% da população mundial detém 50% da riqueza. O ano mais
quente da história recente, onde foram anunciados os eventos extremos
meteorológicos ocorridos nos últimos 20 anos: 6.457 contando enchentes,
tempestades, ondas de calor e secas. Morreram 606 mil pessoas, 4,1 bilhões
ficaram feridas, sem abrigo ou necessitaram assistência de emergência. Mais: 87
milhões de casas destruídas, prejuízos anuais de 250 a 300 bilhões de dólares.
Metas importantes foram cumpridas, como a redução da pobreza, da mortalidade
infantil, do acesso ao ensino, da assistência aos doentes, entre outras coisas.
Entretanto, o relatório da ONU, de 76 páginas, aprovado no final do ano passado
mostra uma realidade cruel da humanidade neste momento. E serve de argumento
para decretarmos o estado do cadáver insepulto do capitalismo. Vamos lá:
A
realidade do mundo em números
- 946 milhões de pessoas defecam ao ar livre, segundo o relatório, que de livre
não tem nada, porque somente na Índia morrem 200 mil crianças por ano de
diarreia, entre outras doenças espalhadas por moscas, mosquitos e outros
insetos, que carregam restos de fezes humanas pelos trajetos usados- como
cólera, desinteria, ebola, hepatite A.
- 880 milhões vivem em favelas, bairros de lata, que são comuns na Ásia.
- 2,4 bilhões, a maioria na zona rural, convive com instalações sanitárias não
melhoradas, como registra o eufemismo dos burocratas.
- 32 milhões estão contaminados com o vírus HIV e não recebem tratamento.
- 16 mil crianças morrem diariamente antes de completar cinco anos. Em 2015
morreram 5,9 milhões, sendo um milhão ao nascer, outro milhão uma semana
depois, e 2,8 milhões nos 28 dias do período neonatal.
- 57 milhões de crianças em idade de frequentar escola estão sem estudar.
- 60 milhões de pessoas abandonaram suas casas em 2014 em razão de conflitos e
guerras, o nível mais elevado desde a segunda guerra mundial. A metade são
crianças.
- 254 milhões estão desempregados – em 2015 -, um número que supera em 53
milhões os números de 1991. O desemprego entre os jovens entre 15 e 24 anos é
três vezes superior ao dos adultos e no ano passado, onde 74 milhões de jovens
estavam a procura de emprego.
- Em 2015, foram registrados 240 milhões de casos de malária com 472 mil
mortes, e outros 300 milhões casos de dengue, sendo que as duas doenças são
transmitidas por mosquitos e estão presentes em 100 países. Inclusive nos
Estados Unidos, onde em 2009 ocorreu um surto na Flórida.
- 1,45 bilhão de trabalhadores em condições vulneráveis, ou seja, sem contrato
de trabalho, sobrevivem com bicos ou por conta própria. A taxa global é de 45%,
mas na África e no sul da Ásia passa dos 50%.
Defecar
ao ar livre é um terror
Defecar ao ar livre é um terror para mulheres e crianças, isso no mundo
digital, com quase quatro bilhões de conexões de internet espalhadas por todos
os continentes. Enquanto 124 mil ultrarricos exibem o luxo de quem tem mais de
500 milhões de dólares. No ano da Declaração do Milênio o conceito de
desenvolvimento envolvia a criação de um sistema comercial e financeiro aberto,
previsível e não discriminatório. Se traçarmos a rota do crescimento mundial,
no caso, a década de 1990 era usada como comparativo – PIB mundial de 27,5
trilhões de dólares – para mais de 80 trilhões em 2015. Entre 20 e 32 trilhões
em paraísos fiscais, como aponta o estudo da Tax Justice Network, do Reino Unido,
onde os 50 maiores bancos privados administram US$12 trilhões. Essa parte da
previsão deve ter sido o “não discriminatório”.
A situação de quem vive em extrema pobreza realmente reduziu de 36% em 1990
para 15% em 2011, o acesso à água potável aumentou de 2,3 bilhões para 4,2
bilhões, a taxa de mortalidade infantil reduziu de 90 para 43 mortes por mil
nascidos. Em 1990 a população mundial era de 5,2 bilhões, hoje de 7,2 bilhões.
É preciso ressaltar, e isto está registrado no estudo da ONU citando o Banco
Mundial, que metade de 155 países pesquisados não tem monitoramento sobre a
situação da pobreza. Na África mais de 60% dos países não têm dados sobre a
situação. Sem contar que apenas 60 países dos pesquisados contam com sistemas
de registros de nascimento.
A
cada minuto morrem 11 crianças no mundo
“- Os progressos para acabar com a fome foram importantes apesar do ambiente
mundial difícil durante a última década. Os obstáculos incluem preços instáveis
das matérias primas, preços mais elevados dos alimentos e energia, aumento do
desemprego e recessões econômicas, no final da década de 1990 e em 2008/09. Os
fenômenos meteorológicos extremos frequentes e os desastres naturais também
contribuíram bastante para a perda de vidas e dos meios de subsistência e
prejudicaram o progresso no sentido da segurança alimentar mundial”, registra o
estudo da ONU.
As instabilidades políticas e as guerras civis agravaram os efeitos dos
desastres naturais – caso da África que contabilizou 77 secas no período -, que
resultou em várias crises humanitárias significativas. O relatório dos
Objetivos do Milênio também ressalta:
“- Os ODMs conduziram progressos dramáticos e sem precedentes na redução das
mortes infantis. Tratamentos eficazes e a custo acessível, melhoria nos
serviços de saúde e compromisso político contribuíram para isso. Mesmo assim, a
cada minuto, em todo o mundo, 11 crianças morrem antes de completar cinco anos,
a maioria de causas evitáveis.”
900
milhões de mosquiteiros com inseticidas
Também morrem 800 mulheres
grávidas, no parto ou logo após, a maior causa morre por hemorragia – 27%. A
mortalidade de crianças e mulheres também é maior nas zonas rurais. Na Ásia,
50% da população ainda vivem em comunidades no campo. Onde os mosquitos atacam
mais. Onde a ONU, através dos programas de saúde distribuiu 900 milhões de
mosquiteiros tratados com inseticidas, reduzindo o índice de mortalidade da
malária nos últimos anos. Mas também aumentando o faturamento das corporações
internacionais de veneno, que também são as mesmas que nunca se interessaram em
produzir uma vacina contra a picada do mosquito Anopheles, assim como nunca se
preocuparam com o alastramento da dengue e a suas complicações, que hoje se
tornaram uma emergência mundial, conforme comunicado da Organização Mundial de
Saúde. Em 2014, um “cluster”, um agrupamento de evidências de distúrbios
neurológicos e malformações neonatais foram registrados nas ilhas da Polinésia
Francesa e depois na Ilha da Páscoa, antes do surto de 2015 no Brasil.
Deixamos
que o 1% acabe o serviço
Um dos pontos dos Objetivos do Milênio é a sustentabilidade ambiental, uma
situação que precisava ser revertida, conforme a declaração do ano 2000.
Aconteceu o contrário. Piorou totalmente. Segue a lista das extinções, do
desmatamento, do aumento dos gases estufa, a escassez de água, que afeta mais
de 40% da população mundial e a queda do estoque pesqueiro – em 1996 a pesca
era de 88 milhões de toneladas, em 2013 foi de 82 milhões, sem contar a
extinção de espécies, a sobrepesca, a poluição, a acidez dos oceanos.
A Organização das Nações Unidas discute as metas para os próximos 15 anos. A
essência do documento deve ser a situação de “como morto” do capitalismo
esclerosado. Porque certamente nos próximos 15 anos a vida no Planeta
continuará caminhando no rumo do desastre, se o atual sistema econômico não for
enterrado. O desafio é óbvio: ou criamos outro sistema, ou deixamos que o 1%
acabe de fazer o serviço, que já está quase completo.
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