Por Marcos de Aguiar Villas-Bôas
O julgamento
do impeachment, aquele que interessa, acontecerá nos próximos dias. As votações
anteriores causaram efeitos positivos e negativos no país, mas esses últimos
podem ser revertidos adiante. É nessa votação final que cada senador decidirá como
quer escrever o seu nome na história.
Houve
efeitos positivos no afastamento temporário de Dilma Rousseff, pois, após 13
anos e 5 meses de governo do PT, boa parte da sociedade havia perdido a noção
sobre quais problemas haviam sido gerados pelo governo petista e quais
problemas eram simplesmente do Brasil, uma vez que sempre ou quase sempre
existiram, e continuarão existindo até que sejam feitas reformas estruturais de
qualidade, que não estão sendo propostas pelo Governo Temer.
Um
aspecto positivo foi observar como umapolítica pautada na ultrapassada
ideologia neoliberal é falha e, assim como naArgentina, gera mais custos
do que benefícios.
Um
governo foi deposto sob alegações de gastos excessivos e corrupção para
colocação de outro muito mais gastador e corrupto.
Logo
após o afastamento de Dilma, houve vazamentos de áudios incriminando
políticos chave do governo interino, inclusive o próprio Michel Temer,
além de políticos de outros partidos até então poupados, como o PSDB,
comprovando que a corrupção é um mal endêmico.
Era
como se a “República de Curitiba” apenas estivesse esperando passar o
afastamento para “atacar” a reputação dos governantes interinos perante a
sociedade e manter a força das investigações. É inegável que o Poder
Judiciário, o Ministério Público Federal e a Polícia Federal estão agindo
ao seu critério para alterar a política.
Os
envolvidos nos vazamentos deveriam expor antes da votação toda a sujeira à qual
já têm acesso e, assim, deixar que a sociedade e os políticos eleitos por ela
decidam o futuro do país. A seletividade significa manipulação política e
social.
Parece
inegável que o governo Dilma tinha menos intenção de interferir na Lava Jato do
que o governo Temer, de modo que é do interesse corporativo da República de
Curitiba a volta da Presidente democraticamente eleita e a realização de
consulta democrática acerca de novas eleições.
Quem
vota contra o impeachment sob o argumento de que vota contra a corrupção está
mentindo. O suposto crime de responsabilidade, também cometido por Temer, foi
afastado pelo Ministério Público Federal e pela perícia técnica do Senado.
Não há nada contra a pessoa de Dilma, mas há inúmeros indícios e até provas
contra Temer e a cúpula do PMDB.
Não
custa lembrar todos os casos de corrupção que vieram à tona recentemente. O
primeiro ministro a cair foi o do Planejamento, Romero Jucá, muito próximo a
Temer, mas exonerado em 24/05 após aparecer em conversas nas quais dizia que o
impeachment tinha o objetivo de parar a Lava Jato.
Minutos
após o afastamento de Dilma pelo senado em 12 de maio, Temer extinguiu a
Controladoria Geral da União (CGU), que fiscalizava os órgãos da União Federal
e ajudava a desbaratar esquemas de corrupção.
Foi
criado o Ministério da Transparência, Fiscalização e Controle, cujo ministro,
Fabiano Silveira, não durou no cargo 30 dias, pois foram vazados áudios seus
criticando a Lava Jato e aconselhando Renan Calheiros, seu padrinho político, e
Sérgio Machado, ex-presidente da Transpetro, a evitar complicações em
interrogatórios sobre corrupção.
Em 16
de junho o ministro do Turismo, Henrique Eduardo Alves, caiu após delação de
Sérgio Machado que mencionou recebimento de dinheiro sujo na Suíça.
Muito
mais está por vir. O chanceler uruguaio expôs tentativa de compra de voto
porJosé Serra, o mesmo que aparece nas delações da Odebrecht como recebedor de
23 milhões de reais via caixa dois.
Todos
sabem que, salvo alguma manipulação forte na Lava Jato, Temer, Serra, Geddel e
outros não demoram a cair por corrupção. Qual, então, o propósito do impeachment,
senão permitir que esses indivíduos se estendam no poder fazendo mal ao país e
servindo ao interesse de alguns poucos, parte deles estrangeiros?
Após as
diversas divulgações do envolvimento do governo Temer vindo ao ar, alguns dos
senadores começaram a declarar que poderiam mudar de voto, como Romário
(PSB-RJ). Segundo a deputada Mara Gabrilli acusou mais tarde, no entanto, ele
teria mantido o voto a favor do impeachment em troca da nomeação da ex-deputada
Rosinha da Adefal para a Secretaria da Pessoa com Deficiência.
Acyr
Gurgacz (PDT-RO), Antônio Carlos Valadares (PSB-CE), Cristovam
Buarque (PPS-DF), Omar Aziz (PSD-AM) e Raimundo Lira (PMDB-PB) são outros
senadores que foram citados como indecisos, apesar de Buarque vir afirmando
agora o seu voto a favor do impeachment, contra a sua história e o que vinha
defendendo algumas semanas antes no sentido de que novas eleições seriam o
melhor caminho para o país.
Antônio
Reguffe (sem partido) e Roberto Rocha (PSB-MA) são outros que cogitaram mudar
de voto caso houvesse a defesa de novas eleições, o que já aconteceu.
Mesmo
aqueles que votaram a favor do prosseguimento do processo de impeachment e que
o defenderam amplamente têm a oportunidade agora de voltar atrás, sendo que a
maioria não dará tanta importância às votações passadas, interessando para a
sociedade, ao final, se o golpe se concretizará ou não.
Sim, ninguém
nega mais que é golpe, nem mesmo aqueles favoráveis ao impeachment. Todos sabem
hoje que se trata de um artifício político utilizado para, na falta de votos,
tomar o poder.
Inúmeros
países estudam cortar relações e pedir a órgãos internacionais aplicação de
sanções ao Brasil, acaso o impeachment se concretize. Não se tem a dimensão do
problema, pois a grande imprensa brasileira, desde o início, é agente central
no golpe, como foi em 1964.
O
senador dos Democratas nos Estados Unidos, Bernie Sanders, que teve
votações expressivas nas primárias e goza de enorme proeminência no país, pediu
recentemente que o seu governo tomasse posição sobre o impeachment no Brasil. É
possível que algo aconteça, se ele vier a se concretizar.
Alan
Grayson, deputado da Flórida, já havia discursado em 13 de julho na Câmara dos
Estados Unidos fazendo duras críticas ao impeachment em curso.
Na
União Europeia, um grupo de 34 deputados pediu o fim do acordo entre ela e o
Mercosul por conta do processo do impeachment no Brasil. As relações estão
estremecidas e certamente ficarão suspensas até 2018 em caso de impeachment.
A
quebra do regime democrático, a tomada do poder sem razão constitucional que a
justifique, afastará o Brasil ainda mais do resto mundo, fazendo o país penar
até o final de 2018, até que um presidente seja eleito democraticamente.
Há
ainda gigantesco risco de Temer cair no meio do caminho, pois o seu nome
aparece inúmeras vezes em áudios, delações e mensagens
de whatsapp com menções a recebimento de dinheiro de corrupção, a
ajuda a Eduardo Cunha para que não seja cassado ou preso e assim por diante.
Devido
ao impasse político criado, que teve a contribuição do governo Dilma, mas que
não pode, apenas por isso, ser destituída do poder, a saída do plebiscito para
devolver ao povo o direito de definir o futuro do país é democrática e levará,
de acordo com pesquisas recentes, de fato à escolha de um novo Presidente.
O
governo Temer não deve durar e, mesmo que chegue a 2018, será em meio a
escândalos, protestos e crise cada vez maior. Menos de 15% do povo aprova
Temer. Não demorará até se consolidar publicamente que o impeachment é um golpe
sujo e todos os apoiadores se juntarão na vergonha pelo resto de suas vidas,
ficando com seus nomes manchados na história até mesmo após as suas mortes.
Ser a
favor de impeachment claramente inconstitucional e, portanto, flagrantemente
golpista é típico de político brasileiro, que pensa nos benefícios individuais
de curto prazo. No entanto, o médio e o longo prazo serão duríssimos com eles.
A história não os perdoará. Deus é piedoso, sempre perdoa, mas castiga. O povo
brasileiro talvez não tenha a mesma piedade.
*Marcos de Aguiar Villas-Bôas,
doutor pela PUC-SP, mestre pela UFBA, é conselheiro do Conselho Administrativo
de Recursos Fiscais do Ministério da Fazenda e pesquisador independente na
Harvard Law School e no Massachusetts Institute of Technology
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